Uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) revelou um cenário preocupante na gestão de recursos públicos pelo Ministério da Cultura. Segundo o levantamento, a pasta acumula 29,7 mil projetos de fomento cultural sem que as respectivas prestações de contas tenham sido analisadas, envolvendo um montante estimado em R$ 22 bilhões cuja destinação ainda não foi devidamente fiscalizada.
Os projetos abrangem iniciativas financiadas por mecanismos como as leis Rouanet, Paulo Gustavo e Aldir Blanc, além de acordos de cooperação e transferências diretas para estados, municípios e entidades culturais. As atividades incluem shows, exposições, peças teatrais e outros eventos culturais realizados em todo o país.
O problema, no entanto, está longe de ser recente. De acordo com o TCU, falhas semelhantes vêm sendo apontadas desde meados dos anos 2000, passando por diferentes governos e gestões. Apesar de sucessivas promessas de solução e da criação de forças-tarefa ao longo dos anos, o passivo continua crescendo.
As informações constam em um relatório técnico sigiloso do TCU, datado de 18 de novembro, obtido pelo jornal O Estado de S. Paulo. O documento é contundente ao apontar ações ineficazes, afrouxamento da fiscalização e falta de capacitação técnica dos servidores responsáveis pela análise das prestações de contas.
Um dos trechos mais críticos da auditoria destaca a fragilidade dos mecanismos de controle do dinheiro público. Segundo os técnicos do TCU, o acompanhamento dos prazos de prescrição — quando o Estado perde o direito de cobrar eventuais irregularidades — é feito por meio de uma planilha em Excel alimentada manualmente, sem sistemas automatizados ou controles robustos.
Durante reuniões com auditores do tribunal, servidores da área responsável demonstraram desconhecer conceitos básicos da legislação, como a diferença entre prescrição intercorrente e prescrição quinquenal, o que, segundo o TCU, evidencia a ausência de treinamento adequado.
O relatório aponta ainda que, dentro do universo de quase 30 mil projetos pendentes, até 1,3 mil podem já ter prescrito. Isso significa que, mesmo que irregularidades sejam identificadas, não será mais possível exigir o ressarcimento aos cofres públicos. A estimativa é que esses projetos tenham recebido cerca de R$ 1,2 bilhão em recursos federais.
Em abril deste ano, a ministra da Cultura, Margareth Menezes, publicou um artigo na Folha de S. Paulo anunciando a adoção de “medidas desburocratizantes” para enfrentar o passivo acumulado. Segundo ela, a proposta seria agilizar análises e destravar processos paralisados há anos.
Em nota oficial, o Ministério da Cultura afirmou que os dados apresentados pela auditoria são preliminares e que a pasta vem adotando uma estratégia de otimização dos processos internos para reduzir o estoque de prestações de contas pendentes.
Apesar das explicações, o relatório do TCU reforça a percepção de fragilidade institucional na fiscalização de recursos públicos destinados à cultura, reacendendo o debate sobre transparência, responsabilidade administrativa e a efetividade do controle sobre bilhões de reais repassados ao setor ao longo de décadas.
📰 Da Redação / Chapada em Foco
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